
Uma situação presente na minha vida me levou a refletir sobre quem seria o responsável caso alguém tome certa atitude após uma leitura de qualquer oráculo.
Algumas coisas me foram passadas pela minha mestre, embora eu ainda não tenha tido muitas aulas com ela: nunca falar de traição; não identificar responsáveis por assassinatos; advertir o consulente a não seguir ação que vise descobrir mais sobre o assunto temático da tiragem. E cumpri todas essas regras.
Uma das garçonetes do café no qual estudo diariamente pediu que eu visse o que havia ocorrido com o irmão dela, já desaparecido há dois anos. Ela (chamada aqui de S.) havia sonhado que ele estava morto e veio a mim para confirmação.

Confirmei, disse que a morte aconteceu no Rio de Janeiro, e que ele estava em um relacionamento sério na época. A garçonete pediu que eu informasse se ele estava solteiro ou não, pois havia a possibilidade de ele ter deixado um filho antes de falecer, o que prontamente vi ser inexistente nas cartas. Sim, o irmão havia morrido. Ele havia falecido durante um relacionamento sério, mas não há filhos deste relacionamento.
Ele havia morrido em uma viagem ao Rio de Janeiro, provavelmente para buscar uma vida melhor (isso me foi passado pela cigana). Vi mais coisas, sobre quem mandou matar e como ele havia morrido, e vi que foi por envolvimento com uma vida perigosa, da qual me viriam males e à família do falecido se eu revelasse. A cigana me orientou a não revelar, e não revelei.
Isso aconteceu há alguns dias. Hoje, ao chegar ao café, uma das outras meninas me disse que a garçonete para a qual fiz a leitura não veio para trabalhar desde então, e que justifica suas faltas pelo que revelei nas cartas algumas noites atrás. Imediatamente, me veio um senso de culpa além do imaginável.
Essa informação da ausência da irmã do falecido de seu trabalho me foi dita hoje, plenos vinte minutos atrás. E enquanto escrevo, sinto uma vontade imensa e irrefreável de chorar. Me sinto responsável.
As meninas estão tendo que lidar com um café razoavelmente cheio por conta dos dias de chuva, com uma funcionária a menos, e me sinto culpada. A culpa é minha, não é? Por revelar informações que levaram às atitudes da garçonete S., que decidiu por não vir mais ao trabalho.

Entretanto, a garçonete F. me disse que a S. nada mais soube através das minhas cartas. Eu só confirmei aquilo que ela já sabia. Pelo que entendi, a garçonete F. estava me dizendo que a responsabilidade não era minha, pois eu não havia dado nenhum fato novo sobre o qual a garçonete S. poderia se debruçar e que justificasse suas atitudes.
Mas não consigo ver dessa maneira. E por isso, comecei a debater em minha mente de quem é a responsabilidade de ações tomadas diante de uma tiragem de cartas?
A responsabilidade da falta contínua ao trabalho da garçonete S. é minha, por ser o motivo de suas faltas informações dadas a ela por mim? Ou a responsabilidade é dela, por faltar? Caso ela morra indo atrás das informações que eu não revelei, pois vi que seria perigoso, e a adverti que deixasse de lado, a responsabilidade seria de quem a mataria, pelo ato em si; dela, por ir atrás do que não devia; ou minha, por avisar que evitasse tal ação?

Tio Ben estava certo. Com grandes poderes, obviamente vêm grandes responsabilidades. Meu dom de clarividência e os outros que fazem de mim a alma de bruxa que sou, são bençãos ou maldições, neste caso? A responsabilidade das faltas dessa garçonete não é minha, por ser o gatilho? Até pode ser, mas não tem ela seu próprio cérebro para tomar suas próprias decisões e atitudes?
Continuo com vontade de chorar, me sentindo culpada? Com toda a certeza do universo. Se as outras meninas me culpam, não sei. Tenho que ser responsável pelo que revelo, não tenho? Será que não é melhor eu simplesmente não abrir mais cartas para ninguém, mesmo que peçam? Seria isso uma atitude herege de minha parte? Estaria eu negando dons que são bençãos ao invés de aptidões que vejo como maldições em horas como estas?
Seria melhor ter esses dons ou tê-los tomados de volta pelos Deuses, visto que aparentemente não tenho utilizado eles corretamente? Qual seria a forma certa tendo em vista não haver manuais? Devo entender a contínua presença de tais dons em meu alcance, uma aprovação das divindades de como venho utilizando-os, considerando que Deuses não têm misericórdia, muito menos com mortais que utilizam de dons dados por eles de maneira incorreta?
Para concluir esse texto, perguntei à garçonete F. e à garçonete I. se me culpavam pelas ações tomadas pela garçonete S., e ambas disseram que não.
“São as ações dela, não as suas. Você é uma cliente legal, faz a gente rir, confia na gente, a gente confia em você… Não teria por que responsabilizar você pelas atitudes dela, quando sabemos e ouvimos o que você contou para ela e não é a primeira vez que ela falta assim. Você só foi a mais nova justificativa”, disse a I., que não é muito de falar.
Ainda assim, fica a dúvida. De quem são as grandes responsabilidades advindas de tais grandes “poderes” (sendo, na verdade, os poderes dos Deuses e entidades, nós humanos, somente permitidos o acesso a eles, não seus “donos”)?
A meu ver, o oraculista tem o dever de traduzir o que o plano espiritual tem a dizer àqueles que não conseguem interpretar e traduzir os sinais de maneira instintiva — é outro idioma, tal como qualquer outro. Uma bruxa é uma nativa de tal idioma, se médium; enquanto outra que não tenha nascido com acesso ao mundo espiritual terá que se esforçar ativamente para tornar-se fluente. E das responsabilidades do consulente?

Já vi textos sobre responsabilidade dos oraculistas. O direito do consulente é saber a mensagem que o mundo espiritual tem a lhe dar. E dos deveres? Quais os deveres de um consulente ante uma tiragem?
Quem sabe em alguns meses eu consiga ter uma resposta para isso dentro de meu próprio desenvolvimento espiritual.
Que seja abençoado.
