Depois de escrever o post “O que é ser uma bruxa no século 21”, aqui, vi que na verdade, daria uns belos capítulos, para dizer o mínimo
DISCLAIMER: Não estou generalizando nem dizendo como é a experiência de outros bruxos/esotéricos com suas fés. SEMPRE me refiro SOMENTE às minhas crenças e vivências.
Mesmo que eu pare para pensar por alguns minutos ou mais, não consigo me lembrar exatamente de como decidi que precisava de uma espiritualidade mais concreta e encaminhada — e eu lembro normalmente de tudo.
Ao crescer, eu sempre soube que tinha alguma afinidade espiritual, considerando que já vi espíritos aqui e ali ao longo da vida — mas minha mãe nunca tinha me falado algo que confirmasse isso até eu, em 2014, lembrar de um ocorrido de quando eu tinha 3 anos. Ela, então, me contou que já tive outras experiências, mesmo que não lembrasse delas, e entendi isso como a minha realidade.

Nunca tinha decidido me chamar de médium; os estereótipos são tão grotescos e a sociedade é tão hipócrita que julga todos que conseguem enxergar o mundo espiritual que qualquer religião pregue existente. Em novembro de 2022, decidi começar a explorar minha mediunidade.
Creio que em dezembro de 2022 ou janeiro de 2023, conversei com minha mãe e considerei seguir o Candomblé ou Umbanda ao considerar minha ancestralidade preta, cigana e indígena: não é porque não senti na pele a dor das minhas ancestrais infelizmente estupradas para o sangue chegar até mim que não as honrarei. Fiquei com medo de ser acusada de apropriação cultural ao começar a buscar tal ancestralidade, e comecei a matutar quais outras religiões encaixavam nos meus preceitos espirituais já enraizados — sempre, desde que me entendo por gente, acredito piamente que a Terra tem a própria vida e consciência, e se equilibra, pois tudo assim o é, energia negativa e positiva, energia masculina e feminina, por exemplo. Ao mencionar tais conceitos à minha psicóloga, ela sugeriu que eu desse uma procurada sobre Wicca.

Eu realmente não sabia nada de Wiccanianos, eu só sabia que os seguidores de tal preceito se chamavam de bruxos/bruxas. Comecei a me identificar fortemente com a reverência aos elementos, mas alguma parte ainda me faltava — eu nunca fui atrás de espiritualizar-me porque não gosto de dogmas limitantes. Sou como toda Sagitariana — uma boa aventura sempre me alegra, principalmente se sigo minha espontaneidade e não tenha medo de ser original, ou estranha, já me chamaram dos dois.
Após alguns meses de tentar me encaixar nos dogmas Wicca de diversas tradições, ainda me sentia insatisfeita. Comecei então a criar minha própria jornada, escolhendo os tópicos de estudo relacionados a todo e qualquer campo espiritual/esotérico sobre o qual expressei interesse. Quando descobri a existência de um círculo de bruxas ao lado do consultório da minha psicóloga, fiquei receosa — ao mesmo tempo que sentia falta de poder expressar as tradições e compartilhar os rituais com outros da mesma fé, eu sabia que a grande fusão de culturas e espiritualidades diferentes que eu tinha juntado e criado como caminho próprio sob as tochas de Hécate não seria aceita por muitas pessoas.
Tirei mais e mais oráculos, tentando entender se a Deusa estava satisfeita com minha grande mistureba, e tudo me levou a entender que sim. Ao reconhecer isso, de repente consegui meditar e meus feitiços deram cada vez mais certo, pois agora sim eu estava sendo eu mesma, minha mente desnuda frente à Grande Mãe.
Caso você considere que ser um bruxo ou bruxa pode ser o caminho para você, quero que pense em como a sua jornada será, sem listas de conhecimentos obrigatórios redigidas por terceiros ou limitações impostas ao mundo espiritual por aqueles que não o experienciam do mesmo jeito que você. Sou bruxa? Sou. Todas as mulheres são bruxas — as primeiras bruxas remontam às bruxarias de cozinha, fazendo ensopados e nutrindo suas famílias com o alimento afetuosamente preparado em um caldeirão em lareiras. De médico e louco, todo mundo tem um pouco… também podemos dizer que de médico e bruxo, todo mundo tem um pouco.

Como eu me tornei bruxa, foi uma decisão minha. Iniciei-me solitariamente em casa, sozinha, sem nem mesmo ajuda de minha mãe ou qualquer participação da mesma, no caso, em meu ritual e em minha fé. Ela sempre me deu a liberdade para eu seguir a espiritualidade que quisesse desde que eu soube que tenho predisposição mediúnica, mas nunca senti a necessidade de desbravar esse caminho até 2022, e andar por crenças pagãs anciãs foi o que escolhi para mim, cujos rituais performei sozinha mas não sem o apoio financeiro, emocional e espiritual da minha mãe – quando questionei minha fé e achei que estava fazendo tudo ao contrário de como religiões normalmente são seguidas. Não é nem um pouco tradicional, e li em vários lugares que seria até errado. Mas, a meu ver, por que a Deusa recusaria a devoção vinda de uma bruxa que busca um caminho para melhor viver e melhor honrar ancestrais pagãos só porque não estaria vindo pelo caminho preestabelecido? Pré-estabelecido por quem, exatamente?

Chegamos, através desta pergunta, ao mesmo questionamento sobre Deus. Deus existe? Mas é lógico. Com muitas faces, em muitos panteões. Zeus, Deus, Olodumarê, Osíris, Odin e por aí vamos. Deus existe, mas o que não existe são as limitações impostas pela Igreja Católica e outras denominações cristãs que dizem saber como Deus pensa, age, o que Ele considera certo, errado, etc. Entendendo isso, seguimos para o entendimento de que para cada pessoa, Deus é diferente; se expressa de maneiras diferentes; age de modos diferentes, mais visível para alguns e menos claro para outros. Cada um tem a própria verdade acima daquela imposta por líderes religiosos.
Garanto que o Deus e a Deusa não irão expulsar você ou lhe punir por seguir seus próprios preceitos e ritos, pois sua fé é verdadeira e tão importante para as divindades e entidades quanto a fé conjunta de qualquer organização ou rito coletivo. O inconsciente coletivo é um só, e você tem acesso às energias de tal egrégora do mesmo jeito que alguém vivendo os mandamentos ao pé da letra tem.
Me chamo de bruxa porque sou, porque é o que me define como pessoa espiritualizada e como pessoa devota fielmente ao paganismo e principalmente à Deusa Tríplice — devoção que agora sei ter perdurado por todas as minhas vidas passadas, principalmente a última, celta. Um dos princípios Wiccanianos que incorporei em minha prática foi a versão bruxesca do Juramento de Hipócrates entoado pelos médicos em sua formatura: jurei nunca fazer o mal a ninguém por iniciativa própria, e nem nunca ajudar em algum ritual espiritual que envolvesse o prejuízo de um ente seja ele deste plano físico ou não, e assim o tenho feito. Caso alguém me ataque, não me vingo; não ataco de volta. Sei que a Deusa me protege e que tal ataque será retaliado com Sua força e poder conforme o que Ela ache adequado e que seja de Sua vontade.
Sigo a Roda do Ano como definição das datas sagradas — compro anualmente o Almanaque Wicca da Editora Pensamento —, lendo diariamente a entrada da data presente no Anuário da Grande Mãe, escrito por Mirella Faur, publicado pela Editora Alfabeto. O Anuário expõe todas as divindades pagãs reverenciadas em cada dia, sugerindo também rituais para devoções a tais divindades, rituais esses que incorporo em minhas orações diárias.


Já o Almanaque é mais sucinto e focado na reverência da Deusa e do Deus independente de suas faces, incorporando todas elas em seus títulos de Deusa e Deus, sem nomes específicos; ele também indica a fase da lua, dia da semana, horário em que a posição da Lua fica fora de curso e quando ela retorna, cores das velas para a oração diária e definição de incenso para seu momento de devoção.
Traçar um círculo mágico através dos elementos e invocando uma Deusa da Terra, uma Deusa do Ar, uma Deusa do Fogo e uma Deusa da Água para cada elemento, cada qual em seu ponto cardinal adequado (Terra ao norte, Ar ao leste, Fogo ao sul, Água ao oeste, embora as tradições xamânicas tenham diferenciações) é algo que aprendi a fazer enquanto estudava sobre Wicca, entretanto hoje sei através de minha mestre espiritual que segue uma caminhada tão original quanto a minha, principalmente pela Umbanda em trabalhos com as Ciganas que o jeito que traço o círculo é algo que ela faz há quarenta anos, e não algo exclusivo do wiccanismo. Então, até mesmo a coisa mais básica, quanto um círculo de proteção, cruza muitas crenças — e você pode jogar tudo num liquidificador e decidir o que vai coar para determinar como sua essência espiritual/religiosa.
A fé de cada um de nós começa em nós e pode encontrar semelhança em crenças alheias, talvez como participação em uma cultuação coletiva como o catolicismo, judaísmo, islamismo, evangelismo, umbanda, candomblé e milhares de outras devoções pelo mundo afora; entretanto pode também não encontrar espelho em nada que você encontre ao procurar desesperadamente por alicerces espirituais que consigam auxiliar-te a distribuir e aguentar melhor o peso em seus ombros causado pelas experiências de vidas passadas, desta vida e de tudo que deve ser trabalhado de maneira espiritual através da profissão de sua fé quando começar a seguir os sinais vistos pelos vitrais de teu espaço sagrado. Vitrais se encontram nos templos, mas também se encontram em nós mesmos — todos podemos escolher enxergar o mundo por vidros coloridos, mostrando-nos o mundo como ele é percebido por meio de cada cor.
Considerando cada cor de um vitral, uma religião e forma de devoção diferente, temos que todos veem o mesmo, mas cada um com seu ponto de vista e com sua vivência próprios — ninguém tem o poder nem deve poder quebrar seu vitral interior. Caso quebre, saiba que não há como quebrar aquele cristal colorido que guia sua fé à sua espiritualidade.

Ela sempre estará lá para você, embora às vezes a luz seja fraca e distante; tendo a luz e a iluminação espiritual como objetivo, não importa o quanto demorar, você a alcançará, e tenha em mente que você pode ser o primeiro e único a forjar seus próprios trilhos, e isso não faz deles menos corretos nem mais corretos do que os outros já forjados antes da sua busca pelo autoconhecimento e por razões maiores do que aquelas explicadas pela racionalidade científica, sem qualquer intervenção espiritual.
Desejo que meus relatos e experiências possam ajudá-lo a entender sua fé e a aceitar sua originalidade e crença do jeito que ela é, sem medi-la por réguas já preestabelecidas por outros dogmas, caso seja essa a sua vontade.
Em nome dos elementos da Terra, do Ar, do Fogo e da Água, da Senhora Ártemis, Senhora da Lua; Senhora Atena, Senhora da Sabedoria e Estratégia; Senhora Perséfone, Senhora da Primavera e das Flores, Rainha do Submundo; Senhora Iemanjá, Senhora dos Oceanos; em nome desses, fecho o círculo que abri a minha volta para escrever esse texto.
Que assim seja, e assim será.
Que seja abençoado.

